Autor: C. S. Lewis
Páginas: 208
Páginas: 208
Editora: Wmf Martins Fontes
Ano : 2009
Classificação: 5/5
Sinopse: Os quatro amores que C.S. Lewis distingue neste livro são a Afeição, a Amizade, Eros e a Caridade. Examina como cada um se combina aos demais, sem perder de vista a diferença necessária e real entre eles. Lewis nos adverte também dos enganos e distorções que podem tomar os três primeiros amores - os amores naturais - perigosos sem a graça suavizante da Caridade, do amor divino que deve constituir a somatória e o objetivo de todos os demais.
Uma
das coisas que sempre admirei nos idiomas hebraico e grego é o fato de que
essas línguas possuem termos distintos para os tipos de amor existentes. A meu
ver, trata-se de uma distinção essencial. Ao nos utilizarmos de uma só palavra
para todos de amores, corremos sempre o risco de não enxergar as suas
distinções, seja de modo parcial ou de modo pleno. Por essa razão, a proposta
de C. S. Lewis em traçar um breve estudo sobre os tipos distintos de amor
existentes me parece muito apropriada.
Os
Quatro Amores foi o décimo quarto livro que li do célebre Lewis. A sensação que
tive, mais uma vez, foi de que este autor (o meu preferido, diga-se de
passagem) possuía mesmo uma capacidade enorme de observar os fatos da vida de
ângulos peculiarmente profundos. Às vezes, ele nos surpreende com algo que nunca
percebemos; noutras tantas transforma em palavras coisas conhecidas de nossa experiência,
mas que não havíamos ainda conseguido expressar (ou não de forma tão
cirúrgica). Em Os Quatro Amores, Lewis oferece ao leitor as duas coisas.
O
irlandês distingue os seguintes amores nessa relevante obra: Afeição, Amizade,
Eros e Caridade. Os três primeiros são chamados por ele de amores naturais. O
último seria o amor divino, do qual os outros três dependem para se tornarem
melhores. Lewis entende que a Afeição envolve aquele amor por coisas, pessoas e
situações familiares. Os alvos desse amor se tornam importantes para nós por
conta do tempo e do costume. Viram parte de nossa vida e, por isso, nos
afeiçoamos.
“Mas a Afeição tem seus critérios próprios. Seus objetos precisam ser familiares. Às vezes sabemos dizer o dia e a hora exatos em que nos apaixonamos ou iniciamos uma amizade. Duvido que alguma vez notemos quando começa uma Afeição. Percebê-la é perceber que ela já existe há algum tempo. O uso de ‘velho’ ou, viveux, como expressão de Afeição é significativo. O cachorro late para estranhos que nunca lhe fizeram mal nenhum e balança o rabo para velhos conhecidos, mesmo os que nunca lhe deram nada. A criança ama o jardineiro velho e rabugento que mal tomou conhecimento dela e se esconde do visitante que está fazendo de tudo para conquistar a sua simpatia. Mas precisa ser um velho jardineiro, um jardineiro que ‘sempre’ tenha estado ali – no curto, mas aparentemente imemorial ‘sempre’ da infância” (p.48).
Sobre
a Amizade, Lewis destaca que é um amor menos valorizado que a Afeição e o Eros
em nossa época. Uma das razões elencadas é que poucos teriam experiências reais
de Amizade por ser ela o menos natural dos amores. Ela pouco se relaciona aos
nossos nervos. Não faz enrubescer ou acelerar o coração. Tampouco é necessária
do ponto de vista da biologia. Afirma Lewis:
“Sem Eros, nenhum de nós teria sido gerado, e sem a Afeição nenhum de nós teria sido criado – mas nós podemos viver e nos reproduzir sem a Amizade” (p. 83).
Uma
distinção interessante que o autor faz é entre Amizade e Companheirismo. Embora
o primeiro não seja condição necessária para a existência da comunidade, o
segundo é; e ele é constantemente confundido com o primeiro. Lewis explica que
a cooperação entre pessoas do mesmo ofício, por exemplo, cria laços que são
necessários. Mas não se trata de Amizade e sim de um tipo de relação que pode
vir a se tornar fonte dela. A Amizade, para Lewis, é algo mais profundo e que,
de certa forma, exclui os demais. É o que eu, particularmente, entendo como a
diferença entre amigos e meros colegas. Ele expressa da seguinte maneira:
“A Amizade surge do mero Companheirismo quando dois ou mais companheiros descobrem que tem em comum alguma ideia, interesse ou mesmo gosto que os demais não partilham e que, até aquele momento, cada um deles acreditava ser o seu tesouro (ou fardo) especial. A expressão típica do início da Amizade seria algo como: “O quê? Você também? Pensei que eu fosse o único”.
Lewis
também faz algumas críticas interessantes dentro desse tema. Uma delas é a de
que a Amizade seria um tipo de Eros escondido ou que Amizade e Eros seriam a
mesma coisa. Ele argumenta, por exemplo, que enquanto dois amigos ficam felizes
quando um terceiro se junta a eles e depois um quarto (desde que as novas
pessoas incluídas no grupo estejam aptas para serem amigos de verdade), não é o
que acontece em Eros. Ele dirá mais adiante que quando uma amizade entre homem
e mulher, por exemplo, se torna amor erótico, isso não obscurece a distinção
entre os dois amores, mas a torna clara. Afirma:
“Se alguém que inicialmente era seu amigo, em sentido profundo e pleno, se revelar, gradual ou repentinamente, também seu amante, certamente você não vai querer dividir com um terceiro o amor erótico do seu amado. Mas não terá absolutamente nenhum ciúme de dividir a Amizade. Nada enriquece mais um amor erótico do que a descoberta de que o amado é capaz, de maneira profunda, verdadeira e espontânea, de fazer amizade com os amigos que você já tinha – perceber que não apenas nós dois estamos unidos pelo amor erótico como também nós três, quatro ou cinco estamos na mesma busca, temos todos a mesma visão” (p. 95).
Em
outro trecho bastante lógico, Lewis comenta:
“É verdade que o que um dos lados oferece como Amizade pode ser erroneamente interpretado como Eros pelo outro, com resultados dolorosos e constrangedores. Ou o que começa como Amizade para os dois pode também se transformar em Eros. Mas dizer que uma coisa pode ser erroneamente interpretada como outra, ou se transformar em outra, não é negar a diferença entre elas. Na verdade, a subentende, pois do contrário não diríamos ‘transformar-se em’ ou ‘ser erroneamente interpretada como’” (p. 102-103).
Sobre
o amor Eros, Lewis faz uma distinção que muito me agradou. Ele explica que Eros
não é apenas sexo. Ele é o amor de casal, o que engloba sexo, mas não se limita
a isso. Assim, ele adota nesse capítulo o termo Eros para o amor de casal como
um todo e o termo Vênus para a relação sexual. Há diversas lições interessantes
que Lewis tira ao descrever esse amor. Escolho compartilhar nessa resenha um
trecho sobre como Eros, por mais nobre que possa ser ao fazer promessas
sinceras e ser altruísta por um tempo, não tem como se manter nesse estado sem
cessar. Ele diz que:
“O velho ‘eu’ logo se mostra menos morto do que parecia” (p. 158).
O diferencial está nos casamentos feitos entre duas pessoas decentes
e sensatas. O casal que será ameaçado pelos lapsos do velho “eu” é aquele que
idolatra o Eros. Lewis sustenta:
“Esses amantes o supõe dotado do poder e da veracidade de um deus. Espera que o mero sentimento faça por eles, e de modo permanente, tudo o que for necessário. Quando a expectativa se frustra, põem a culpa em Eros – ou, o que é mais comum, nos parceiros. Na verdade, porém, Eros, ao fazer sua promessa gigantesca e mostrar vislumbres de como vai realizá-la, já ‘cumpriu o seu papel’. Ele faz os votos como um padrinho; somos nós que devemos cumpri-los. Somos nós que devemos nos esforçar para que nossa vida cotidiana se aproxime cada vez mais do que nos foi mostrado de relance” (p. 159).
O
último amor analisado por Lewis, a Caridade, começa a ser descrita no capítulo
como algo “que precisa vir em socorro do mero sentimento, para que o sentimento
mantenha a própria doçura” (p. 161). Os amores naturais não bastam. Eles
precisam do amor de Deus para se tornarem aquilo que foram projetados para ser;
e para se tornarem ainda mais puros e melhores em meio às dificuldades da vida
em um mundo caído.
Nesse
capítulo, Lewis nos traz alguns insights interessantes sobre como nossos amores
naturais devem se relacionar com esse amor de Deus, a Caridade, que é o amor
absoluto, o original. Em um trecho afirma o seguinte: “Se na atitude do amado
há implícito um “tudo por amor” – “tudo” mesmo –, seu amor não vale a pena. Não
está relacionado ao Amor Absoluto da maneira certa” (p. 174).
Para
Lewis, é esse Amor Absoluto que torna possíveis e até mais recorrentes algumas
atitudes difíceis que só os amores naturais, sozinhos, não conseguiriam. Assim,
Deus está sempre nos convidando a deixar que Ele transforme nossos amores
naturais em expressões da Caridade, o Amor Absoluto. Em geral, esses convites
são feitos por meio dos aspectos de nossa existência de que mais nos queixamos.
Ele diz:
“O convite para transformar nossos amores naturais em Caridade nunca é omitido. É provido pelos atritos e frustrações com que deparamos em todos eles, o que é prova inequívoca de que o amor (natural) nunca será ‘suficiente’ – inequívoca, isto é, se não estivermos cegos pelo egoísmo. Quando estamos, fazemos uso deles de maneira absurda” (p.187).
Os
exemplos usados por Lewis sobre como muitas vezes usamos os amores naturais de
forma absurda são bem recorrentes e nos dão um vislumbre de como somos
limitados sem o amor de Deus:
“‘Se eu tivesse mais sorte com meus filhos (o menino está ficando cada dia mais parecido com o pai), eu conseguiria amá-los perfeitamente’. Mas toda criança é detestável, às vezes; a maioria delas, não raro é detestável. ‘Se meu marido fosse mais atencioso, menos preguiçoso, menos extravagante...’, ‘Se meu pai não fosse tão infernalmente chato e pão-duro...’. Mas em todas as pessoas, o que evidentemente inclui nós mesmos, existe algo que exige paciência, tolerância e perdão. A necessidade de praticar essas atitudes é o que inicialmente nos leva ou nos obriga a tentar transformar – ou, mais estritamente, a deixar que Deus transforme –nosso amor em Caridade. Esses aborrecimentos e dificuldades são benéficos” (p. 188).
No
meu entender, a Caridade é um amor geral, que pode (e deve) acompanhar todos os
outros. Uma vez que todos descendem dele, apenas são completos com ele.
Portanto, é apenas quando a Caridade invade nosso ser e preenche todos os
nossos amores é que somos capazes de amar em intensidade semelhante a de Deus.
Por essa razão, Jesus eleva seu mandamento de “amar o próximo como a ti mesmo”
para “amar-vos uns aos outros como eu vos amei”. É pela mesma razão que Paulo
afirma que o marido deveria amar a esposa como Cristo amou a Igreja e se
entregou por ela. Não é possível amar nesse nível sem a Caridade vinda do
próprio Deus. Ou há de se amar pouco, ou há de se transformar o amor por uma
pessoa em fanatismo e idolatria.
A
obra de Lewis é muito agradável de ler, assim como as demais, e nos traz lições
preciosas sobre como entender e lidar com cada tipo de amor. Cima de tudo, ela
nos leva à fonte dos amores. No geral, concordo com tudo o que C. S. Lewis diz
em seu livro. Um ou outro exemplo talvez seja um pouco desatualizado, já que a
cultura de nosso tempo já é um pouco diferente da cultura em que ele viveu. Mas
como todo o grande autor, sua escrita permanece muito atual. É mais um livro
para enriquecer nosso conhecimento teórico e nos induzir a um cuidado prático
maior com as coisas divinas.
Esse livro é mesmo muito bom!!!
ResponderExcluirExcelente resenha! Foi muito bom reler alguns trechos desse livro.
Ótimo, não é? Lewis era incrível! :)
ExcluirEstá na minha lista de "desejados" :D
ResponderExcluirQuero muito ler, mas ainda não deu pra comprar, hehehe
Compre mesmo! Não vai se arrepender. :D
ExcluirAbraços!
Meu próximo livro, com certeza está na minha lista de desejos...rs
ResponderExcluirNem tudi desse resumo condiz com o resumo verdadeiro. Por exemplo quando diz que Eros e amizade poderiam ser a mesma coisa, negativo.
ResponderExcluir